segunda-feira, setembro 21, 2009

Doação de Órgaos

Há quase dois meses eu fiz algumas matérias sobre Doação de Órgãos, para um guia que vai sair no Estadão - no dia 26 de setembro. No guia, as matérias foram cortadas e transformadas em frases... Como não utilizamos as matérias, decidi publicá-las aqui. Acho que é um material rico de informações e não pode ser desperdiçado. Segue o texto principal e a cada dia, publico mais um. Você já é doador de órgãos? Veja o quanto este gesto pode salvar vidas!!
Boa leitura!!

Doar: Um gesto de amor além da vida
por Márcia Moreno Placa


Temos uma grande missão até 2017: triplicar o número de doadores de órgãos no Brasil. Atualmente a proporção é de 6 doares por milhão de pessoas e a intenção é chegar a 20 doares por milhão – número próximo de países como França (22ppm) e Estados Unidos (26 ppm). “Estamos trabalhando para que cresça o número de doadores em todo Brasil, queremos que aumente 15% ao ano até janeiro de 2017”, diz o presidente da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), Valter Duro Garcia, uma das autoridades no assunto, que foi conhecer de perto o modelo espanhol de gestão de transplante de órgãos, que é considerado o melhor do mundo. Ele já comemora algumas vitórias: de 2006 para cá já houve um aumento de 30% no número de doadores. E não é à toa, o programa de transplantes no Brasil se destaca por diversos aspectos. “O Sistema Nacional de Transplantes (SNT) do Brasil está maduro”, avalia o vice-presidente da ABTO e Chefe do Programa de Transplantes do Hospital Israelita Albert Einstein, Ben-Hur Ferraz Neto. “O Brasil é o segundo pais do mundo em número absoluto de transplantes e o que mais investe recurso financeiro público em transplantes no mundo, ou seja, o maior Programa de Transplantes Público do Mundo”, diz. Atualmente, o Brasil realiza 15 mil transplantes ao ano, entre órgãos e córneas.

Mas apesar das boas notícias, o Brasil ainda está longe do que é ideal na área. Para isso, Duro acredita que os 4 pilares de sustentação dos transplantes de órgãos deverão de desenvolver de forma harmoniosa. “A legislação e o financiamento – devem ser aprimorados, mas não atrapalham neste momento. O que deve ter maior atenção no momento: a organização dos hospitais e educação da população. Com estes 4 itens trabalhando em conjunto, conseguiremos alcançar o nível desejado”, avalia. Para conseguir organizar os hospitais, as equipes estão sendo treinados para lidar com a questão. “É preciso ter uma equipe integrada para trabalhar desde a detecção da morte encefálica, o trato com a família, os aspectos logísticos e o transplante em si”, diz Duro. “É preciso criar o especialista em doação de órgãos e tecidos, ou seja, os denominados coordenadores intra-hospitalares de transplantes, além de treinar os médicos das unidades de terapia intensiva e os das unidades de emergência sobre os benefícios e sobre a legislação em transplante. Isto vem sendo feito com resultados excelentes há alguns anos nos Estados de São Paulo e de Santa Catarina”, avalia Ferraz Neto. E é necessário também diminuir as diferenças regionais sobre o assunto entre os estados. São Paulo é o estado que mais realiza transplantes. Cerca de 90% destes tipos de procedimentos realizados no país são feitos através do SUS, que cobre todos os custos, mas a maioria é nas regiões Sul e Sudeste. “Precisamos atingir também os outros Estados e aumentar o número de transplantes em todo Brasil”, diz Duro. Com estes cuidados na organização, ele acredita que o aproveitamento de órgãos pode ser melhorado de 10 a 20%.

O ponto fraco da questão é mesmo a doação de órgãos. Várias campanhas estão sendo realizadas para sensibilizar a sociedade sobre o assunto. “É preciso evoluir ainda muito, pois temos um número muito grande de pacientes em lista de espera e ainda, infelizmente, um número pequeno de doadores”, revela Ferraz Neto. Atualmente quase 66mil pessoas aguardam na fila de transplantes no Brasil – sendo que 34 mil aguardam na fila por um rim. “O número de cirurgias está abaixo das necessidades da população, pois falta a doação de órgãos”, diz Duro. Estima-se que, todos os anos, seja realizada, no Brasil, apenas a metade do número de transplantes de córnea necessários. A situação é mais grave no caso de rim, um terço, e ainda pior para os pacientes de fígado, um quarto. Os transplantes de coração equivalem a menos de 5% do que seria preciso. As filas de espera crescem tanto que, dependendo do órgão, 10%, às vezes até 30%, dos pacientes morrem antes de ir para a sala de cirurgia. Para Ferraz Neto, é necessário esclarecer a população sobre o conceito da morte encefálica para que aumente o número de doares. “A morte encefálica trata-se de uma morte, a diferença é que, por meio de aparelhos e medicações, o coração continua batendo com o único objetivo de continuar irrigando os órgãos como o fígado, pulmão, rins, pâncreas, intestino e o próprio coração para que possam ser utilizados para transplante”, ensina. A morte encefálica é comprovada por dois médicos diferentes – nenhum deles da equipe de transplante e é confirmada por um exame que demonstra que o encéfalo não tem qualquer irrigação sanguínea. “Isto é totalmente diferente de coma e não há qualquer possibilidade de algum médico errar este diagnóstico. A lei Brasileira é uma das mais rigorosas do mundo sobre esta questão da morte encefálica e da doação de órgãos após a morte”, comenta.

O Sistema Nacional de Transplantes é considerado transparente – principalmente por conta da criação da fila única. “Podemos garantir que não existe a menor possibilidade de alguém passar na frente de alguém na lista de espera por qualquer influência política, financeira, social, racial e etc. Regras claras determinam quem será contemplado com o órgão doado e procuram, através do melhor conhecimento médico da atualidade, oferecer aquele órgão a quem mais precisa dele, pois está mais grave e com maior chance de morrer”, fala Ferraz Neto.

E para ser doador de órgãos não é necessário deixar nada por escrito ou ter registrado em documento que se é doador. Basta manifestar para família, em vida, o desejo de doar os órgãos após a morte “Isto facilitará a decisão da família, que é quem decide pela doação na hora da nossa morte” considera Ferraz Neto. “E a única certeza que temos na vida é a de que um dia vamos morrer. A pergunta é: por que não ajudar as outras pessoas também neste momento? Muitas delas deixarão de morrer por este gesto. Se temos dificuldade em falar sobre a morte, vamos falar sobre a vida das outras pessoas que podem ser salvas”, completa. “Temos que lidar com a doação de órgãos como um gesto de amor além da vida!”, conclui Duro.